Não é novidade que a galera LGBT+ faz muita música boa e que também são pessoas que enfrentam um puta preconceito. Não é novidade que nós do Groundcast apoiamos todo e qualquer artista underground e marginalizado, sendo nosso enfoque em metal e música experimental. Por essa razão trago para vocês a minha singela lista de artistas LGBT+ que eu admiro bastante por uma série de coisas. Espero que gostem e prestigiem seus trabalhos.
Genesis P-Orridge
Se existe uma figura que nunca, jamais, estará fora desta lista é Genesis P-Orridge. Primeiro porque é alguém dentro do que se convenciona como não-binário. Constantemente se referia como ele e ela e até mesmo nós (em inglês o pronome usado é s/he), tendo isso como parte de um projeto maior chamado de pandrogênia, em conjunto com sua falecida esposa, Jaye Breyer, para uma unificação entre homem e mulher ou, como se referia, “nem homem, nem mulher, nem nada, apenas completo”. Fundou a Industrial Records e criou o primeiro trabalho de música industrial, o Throbbing Gristle, numa proposta de provocar a música convencional, trazendo os ruídos, as dissonâncias, as temáticas de mau gosto ligadas ao fascismo, ao esoterismo, ao horror gore, ao humor negro, à sátira política, ao sexo depravado e outras coisas não populares. Sem Genesis não existiria nada de música industrial, nem mesmo grupos como Nine Inch Nails, Laibach, Einsturzende Neuebauten, Test Dept e todos os que usam de música não-convencional. As temáticas abrasivas, provocativas, que foram ainda mais longe que o punk, tudo isso surgiu com Genesis e amigos.
John Balance e Peter Christopherson
Peter foi um dos membros do Throbbing Gristle e, quando saiu, montou junto com John Balance o primeiro projeto de dark ambient do mundo, o Coil. Dois homens gays mostraram ao mundo que a música ambiente experimental podia carregar sentimentos, trazer emoções como medo, melancolia e até mesmo figurar em filmes. A trilha sonora original de Hellraiser era do Coil, mas foi rejeitada por não ser comercial o suficiente.
David Bowie
Falar de David Bowie sem mencionar o quanto ele é importante para a música e outras áreas da arte é injusto. Ele foi um musicista de muito talento e visão, trabalhando sempre com músicos excepcionais como Lou Reed, Klaus Nomi, John Lennon, Cher, Iggy Pop, Robert Fripp (King Crimson), Stevie Ray Vaughan, entre muitos outros. Era assumidamente bissexual e já teve casos com muita gente, incluindo Mick Jagger do Rolling Stones. Também tem uma filmografia bastante interessante e, acima de tudo, é influência para muita gente boa.
John Cage
Não é nenhum segredo que eu sou um grande apreciador de música experimental e muito da ideia do Groundcast se deve a esse tipo de música. John Cage é, junto com Karlheinz Stockhausen, um dos grandes nomes da chamada música concreta. Ele fez experimentos, incluindo a música mais longa do mundo, que tem duração prevista para 639 anos. Também é outro artista que nunca escondeu sua bissexualidade, embora nunca fosse um ativista dentro da causa pelo LGBT+, ele ainda é uma pessoa admirável por ser um dos grandes nomes da música erudita moderna.
Wendy Carlos
Wendy Carlos é uma mulher trans que revolucionou e muito a música. Primeira pessoa a transpor para o sintetizador Moog algumas canções de Bach, trazendo para o grande público um excelente trabalho com a música erudita. Além disso ela compôs a trilha sonora de grandes clássicos do cinema como Laranja Mecânica (1971), O Iluminado (1980) e Tron (1982). Também fez uma música em parceria com o Weird Al” Yankovic para uma paródia da música Peter and the Wolf, do compositor russo Sergei Prokofiev, que acabou se transformando em um disco completo.
Rob Halford
O heavy metal, seja em sua sonoridade, seja em sua estética, deve muito a este homem. Halford incorporou no visual do Judas Priest muito dos elementos da cultura gay e também dos ambientes BDSM, como o uso de couro, roupas apertadas, metal e outros elementos. Rob é sinônimo de heavy metal, é referência para qualquer banda ou fã do gênero e também uma pessoa com bastante atitude. Painkiller é um dos maiores discos de todos os tempos (não somente de metal) e a carreira solo também tem coisas muito boas.
Darren Hayes
Eu sou um grande fã do Savage Garden, um grupo pop que fica no meio termo entre o pop e o rock, mas ainda sim dentro da música pop. É dono de uma voz bem bacana, diferente do vocal masculino de pop dos anos 1990 e sem seguir a fórmula do Michael Jackson ou mesmo das boy bands. Para a música australiana, é um marco interessante ver um homem gay atingir tanto sucesso, com 23 milhões de cópias de seus discos vendidas em todo o mundo e algumas turnês nas costas, antes da dupla se desfazer por brigas.
Klaus Nomi
Primeiro, ele era dono de uma voz incrível, que deixou clássicos como Lighting Strikes. Também tocou com David Bowie quando foram ao Saturday Night Live, numa apresentação memorável. Era um homem gay, extravagante, ousado e que conseguiu fazer sucesso não somente por sua música, mas com uma estética bastante ousada para a sua época. Infelizmente foi uma das primeiras vítimas da AIDS e morreu em decorrência de doenças oportunistas.
Amanda Palmer
Mais uma pessoa sensacional que faz parte da sigla B do LGBT+, Amanda Palmer é uma artista sensacional. Eu, pessoalmente, sou mais fã do trabalho dela com o Dresden Dolls, que mistura punk com estética cabaré, mas ela também tem uma carreira solo bem legal. Um de seus parceiros de música é o renomado Edward Ka-Spel, da banda Legendary Pink Dots. Atualmente é casada com Neil Gaiman, tem um filho e usa as redes sociais para militar por causas ligadas ao feminismo, direitos civis e também contra o fascismo.
Freddie Mercury
Eu gosto de Queen desde que eu me conheço por gente e Freddie sempre foi uma pessoa que me influenciou muito no quesito escutar música. Tanto os trabalhos dele no Queen quanto a carreira solo são muito bons. Dono de uma voz que ficou registrada como uma das mais marcantes dentro do rock e referência para muitos vocalistas, ele levou bem a sério a vida de sexo, drogas e rock ‘n’ roll. Embora muita gente ache que ele era apenas homossexual, Freddie era, na verdade, um homem bissexual, que teve casos tanto com homens quanto mulheres. Foi também uma das vítimas das complicações advindas de doenças oportunistas.
Paul Masvidal e Sean Reinert
Dois homens gays são os fundadores de uma das bandas de metal mais legais que eu conheço, o Cynic. Uma banda que misturava metal progressivo com vários elementos de música eletrônica, incluindo o uso de vocoders, além de muita técnica, que chamou a atenção de Chuck Schuldiner, guitarrista e fundador do Death, para que ele tocasse no disco Human. A mistura de jazz e metal, com o uso de elementos de extrema complexidade, influenciaram muita gente como Ben Weinman e Chris Pennie do The Dillinger Escape Plan, Tomas Haake do Meshuggah, Brann Dailor do Mastodon, Dan Presland do Ne Obliviscaris, Daniel Moilanen do Katatonia e muitos outros. Paul ainda é inventor do VIDATAK Ez Board, um sistema que auxilia a comunicação entre pacientes que não têm condições de se comunicar e os médicos. Sean, infelizmente, teve um problema cardíaco ligado à hipertensão e morreu no começo de 2020.
Föxx Salema
Ser artista independente de metal no Brasil é um trabalho dos mais complicados, pois falta apoio, falta investimento e é tudo muito caro. Pior quando você tenta entrar num meio sendo transexual com visões à esquerda. Amy tem muita coragem e muita força de vontade para bater de frente contra todos esses preconceitos e problemas para trazer a sua música para o mundo. A despeito de todos esses problemas, vem crescendo aos pouquinhos dentro dessa cena que insiste em dizer que não há espaço para ela. Rebel Hearts é um bom disco e os próximos lançamentos prometem muito, ainda mais com uma banda fixa e dedicação de sobra.
Drake Chrisdensen
A forma como conheci o Drake foi um pouco diferente do que costuma acontecer comigo no Groundcast: ele veio elogiar um dos artigos que escrevi aqui no site, que por acaso era este daqui. Nessa conversa rolou um convite meu para uma entrevista, mas até esse momento, eu nem imaginava que ele era um homem gay à frente de uma banda de metal sinfônico. O mais legal da banda dele, a Ruins of Elysium, é que ela traz alguma coisa nova a um gênero saturado (e convenhamos, até meio coxinha nesse sentido), sobretudo com o seu último trabalho. Também faz um trabalho muito bom como vocalista, usando sua potente voz de tenor para dar mais força à música.
Juntaro Yamanouchi
Eu não era muito fã de noise japonês, pois sempre achei que eles tinham uma ideia muito mais artística e longe do que eu acho que industrial precisa ser. Juntaro, junto com o Gerogerigegege, me trouxe aquilo que eu esperava do famigerado japanoise. É um projeto extremamente grotesco, com uma estética que vai da escatologia ao sexo, com muito humor bizarro. Ele também participa do Nihilist Surfin’ Group e The Omanko.
Com ele que depois cheguei ao Merzbow (e passei a entender melhor como funciona o gênero), além do sensacional Hijokaidan. Mas se é para começar bem no noise japonês, comece por ele e não vai se arrepender (e nem ver um aspirador de pó com os mesmos olhos).