O funk é o novo punk: quando o butthurt atinge níveis astronômicos

5 min


0

Capa-artigo

A gente reconhece a mentalidade de um fã quando observa que tipos de comentários ele faz. E como ele também se enxerga e aos outros. Ao escrever meu texto “O funk é o novo punk”, tive um resultado dentro do que eu esperava: que o fã de rock e metal “mediano” é preconceituoso, elitista e babaca.

Primeiro, eu não vou me ater aos comentários imbecis, porque seria o mesmo que tentar responder a uma porta. Existem tantos erros de argumentação, palavras de ódio contra a minha pessoa e contra o que foi exposto que só me basta rir da mentalidade boçal de quem por ali opinou. Mas fico também imensamente feliz em saber que muita gente entendeu o recado.

Vou colocar aqui algumas questões que eu notei por ali no que foi comentado, vai ser algo mais ou menos na linha de um FAQ.

butthurt

Você não conhece as letras de tal banda para falar isto.

Antes que alguém venha falar asneiras, eu conheço e muito bem as letras das bandas. E sabe por que? Porque eu também as escuto. As letras “politizadas” da maior parte dos discos dos anos 90 em diante são extremamente vazias, vagas, com uma mediocridade adolescente que me irrita. O rock nunca precisou deste lado “politizado” para fazer sucesso, embora o punk tenha trazido, depois da sua criação, esse lado de contestação sócio-política, com bandas queer, feministas, anarquistas e até mesmo com o discurso do ódio, como acontece o Skrewdriver. Mas o gênero não precisa ser assim, se não quiser.

Minha crítica recai sobretudo em grupos como o Megadeth, que exalam o puritanismo e o conservadorismo até o último riff de guitarra, mas querem se vender como se fossem os arautos da liberdade. Ele critica as Nações Unidas em seu “United Abominations”, como se ela fosse a responsável por muitas das mazelas sociais. Contudo, foi um grande apoiador do George W. Bush e, após muitos problemas envolvendo sobretudo a própria opinião pública americana, resolveu “dar para trás” e dizer que era contra. Mas ainda continua a usar seu discurso conservador em diversas outras situações, demonstrando claramente qual o seu posicionamento.

Olha pai

Certamente você é um funkeiro de merda para escrever este lixo.

Para a sua surpresa e a dos demais, eu odeio funk com todas as minhas forças. Simplesmente não suporto ouvir uma música do gênero, visto que ele me desagrada em muitos aspectos. Mas, para falar alguma coisa sobre ele, eu precisei pesquisar e ler muita coisa. Ato que deveria ser feito por pessoas que concordam ou emitiram este tipo de frase colocada acima.

O que na verdade eu critiquei não foi o rock e o metal propriamente ditos. Critiquei o DISCURSO deles como manifestação artística e expus o contraponto, onde a embalagem vendida destes gêneros não se aproxima nem à metade do que acontece em outros gêneros de música popular, como o funk e até mesmo o sertanejo. E mesmo assim não escuto nem um e nem o outro.

Isto é conhecer aquilo que gosta e aceitar, inclusive, suas falhas e hipocrisias. Eu aceito que o rock e o metal são estilos que estão diluídos em termos de importância cultural e, em alguns termos, política. Mas não ligo e sei que ele também pode e deve ser criticado.

Metal

Funk é música de gente idiota. Funk é um lixo.

O babaca que se propõe a repetir isto certamente acredita que exista um “ranking” que coloca coisas em patamares de excelência. Ao mesmo tempo, também faz um trabalho bastante ingrato em atribuir a um possível ouvinte qualidades que nada tem a ver com o que ele gosta.

Dizer que quem ouve funk é burro, idiota e coisas do tipo, certamente escuta rock e metal na tentativa de preencher a sua mediocridade existencial. Esta pessoa liga tanto para o status que isto proporciona ao ponto de esquecer a razão de gostar daquele tipo de música. É outro discurso também levado junto com o gênero hoje, de que ele é uma “evolução”, por possui mais “técnica” e letras mais “profundas”, exigindo mais atenção de quem ouve.

Se você ouve Dream Theater para dizer aos outros que é entendido de música, você não passa de um idiota. Caso contrário, você escute porque gosta e deseja entender a complexidade das composições, ponto para você. Pois o trabalho deles não é superior e nem inferior ao de outros artistas de música popular. Criar também um juízo de valor, que exclui aquilo que não está dentro dele, é sinal de imaturidade.

Tanto que, caso boa parte dos críticos não saibam, pessoas ligadas à música erudita normalmente estão cagando e andando para o rock. Elas fazem exatamente aquilo que todo mundo deveria fazer com relação àquilo que tanto detestam: ignorar. Eu não curto funk, nem sertanejo, nem forró e nem nada dessas músicas mais popularescas, então simplesmente as ignoro.

blablabla

Você não sabe do que está falando…

Primeiro, quem é você para me dizer o que eu conheço ou não? Vamos estabelecer que, baseando naquilo que sua visão de mundo compreende, o que eu conheço ou não deveria ser menos relevante do que a lógica dos meus argumentos. Eu não uso nada do que eu sei, tanto empiricamente quando academicamente, para posar de autoridade para ninguém, como aconteceu na postagem.

Tem o fato de que a maioria sequer sabe que também existe uma literatura muito grande dedicada a justamente trabalhar a análise discursiva e aplicá-la nas produções culturais. Tudo é passível de crítica, desde que seja coerente. Eu, por exemplo, não vejo sentido na vertente do “funk ostentação”, pois ele valoriza exatamente a cultura do consumo e coloca para seu público-alvo a ideia da ascensão e do poder, tentando entrar no universo elitizado. Da mesma forma aconteceu com o Rap, cujo momento era chamado de Bling-bling, sendo análogo em termos de temática ao funk ostentação. É desvinculado de sua raiz crítica.

E podemos ainda traçar paralelos ainda mais interessantes. Critica-se no funk as temáticas pornográficas, mas existem bandas como Cannibal Corpse e Cradle of Filth que também as usam. Fala-se do uso de drogas, mas grupos como Bongzilla e The Electric Hellfire Club também fazem menções a drogas. Marilyn Manson, Kiss e outros artistas também fazem ou fizeram as mesmas coisas. E aí alguém pode soltar a seguinte pérola:

“Mas as letras não são para serem levadas a sério…”

Exatamente, criatura. Assim como em qualquer outro gênero musical. No funk a ideia é realmente tirar um sarro das coisas, não levar a sério, fazendo até mesmo uma auto ironia, ainda que involuntária. É exagerar em determinadas coisas, ao ponto de que elas soem absurdas e cômicas. E isto as torna, mesmo que de forma inconsciente, subversivas. Não é proposital uma artista como a Valeska Popozuda falar o que fala e ter este efeito catártico, mas, por conta de outros fatores, acaba assumindo este papel.

O que eu quero dizer com tudo isto? Que estou imensamente feliz em notar o efeito do meu texto nestas pessoas. Comprovar, ainda que de forma empírica, a imaturidade do fã de rock e de metal frente a uma crítica fatual e a sua incapacidade de argumentar de forma contrária. O ódio destes comentários não somente mostra o quanto estou certo: mostra que as pessoas são incapazes de lidar com críticas. É evidente que não são TODOS os fãs que agem assim. Aliás, até posso dizer que nem a maioria se manifesta de forma direta em páginas da internet. Mas os que o fazem, são extremamente barulhentos e incômodos.


Editor, dono e podcaster. Escreve por amor à música estranha e contra o conservadorismo no meio underground.