O industrial e o extremismo musical: flertes com o militarismo

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O militarismo na música industrial

Faz um bom tempo desde que abordei este tema no meu antigo blog. É recorrente lembrar o quanto os projetos se valem da parte estética e simbólica do militarismo. Isto reflete o lado ambíguo deste, apoiada na fascinação pelos símbolos de poder. Em primeiro plano, representa-se a força e a dominação dos mais fracos, em um princípio. As pessoas se tornam temerosas por conta de sempre existir a associação entre esta dominação e um estado onde não se existe a liberdade individual e um autoritarismo sem igual, tendo como reação natural a repulsa e o ódio.

Por outro lado, um lado fetichista também aparece por meio desta simbologia. A dominação pode parecer excitante, até mesmo prazerosa, quando associada com o masoquismo, criando uma relação onde a força seduz e conquista. Isto também pode se aplicar, em determinados pontos, a figuras de poder, como policiais, pais, ditadores e outros.

O industrial se apropriou destas duas imagens ao pegar o lado militar da música e coloca-lo de forma a criar um contexto por si só. O choque se deu exatamente neste ponto, onde as pessoas poderiam imaginar o que elas bem entendessem. Genesis P-Orridge sempre combinou estes elementos, mais a magia negra (de certo modo) e até mesmo um lado extremamente pornográfico e escatológico nas suas composições, dando um lado mais ácido e agressivo ao performático Throbbing Gristle e mesmo ao COUM Transmissions, ligado ao movimento Fluxus.

Então, para a “primeira onda” dos grupos de industrial, o militarismo era um símbolo a ser colocado contra os valores sociais. Era uma forma visual de chocar as pessoas e irem contra o “mainstream”, continuando com o ideal dos primeiros punks. Para aqueles, estes não tinham conseguido ir além do que a indústria cultural mandava, sendo, por esta razão, facilmente absorvidos. Projetos como Throbbing Gristle, Monte Cazazza, Clock DVA e outros eram chocantes e controversos justamente pelos temas que abordavam, contrários ao senso comum de grande parte das pessoas.

Front 242, um dos grandes nomes do EBM

O estilo militar também passou para os movimentos post-industrial. O EBM se valia da mesma estética visual, aliando a letras sobre guerra e problemas sociais. O electro-industrial, por consequência, retoma os temas, como no caso do grupo Acyllum. O metal industrial (e o rock também) pegou esta parte da imagem, visível em trabalhos como os do Rammstein, Stahlhammer, Deathstars, Marilyn Manson etc. Fora do que poderia ser considerado como “parte” do industrial, Combichrist, Grendel, Suicide Commando, Straftanz, Nachtmarh etc. Mesmo grupos de rock e metal vez por outra colocam estes tipos de temáticas, tanto nas letras quanto no visual. Todos eles usam estas ideias como temas, não para propagar ideais pessoais ou fazer propaganda de algum tipo de ideologia. O discurso, muitas vezes, possui um teor fascista, próprio das imagens utilizadas.

Ao se falar em tematização, coloca-se na verdade alguma coisa (assunto, por exemplo) e se reduz a ideia, muitas vezes esvaziada de seu contexto. Por conta disto, grupos mais “pop” acabam se apropriando da imagem e ignora qualquer implicação além do prazer estético. Por causa disto gente como Lady Gaga aparece em fotos com estilo mais “militar”, evocando uma faceta mais fetichista, desprovida de qualquer intencionalidade além da apreciação visual.

Por fim, convém mencionar o lado mais “belicista” surgido no martial industrial, derivado do neofolk. O grupo Rome, por exemplo, aborda temas militares e demonstra o quão tolas são as pessoas e os seus extremos. Todo este “aparato” serve para transmitir um ideal fascista, dado por toda a representação criada pelas músicas e letras, sem contudo, necessariamente, existir algum envolvimento por parte dos artistas. É uma espécie de fascismo apolítico, um estado comparável ao fato de as pessoas rejeitarem o indivíduo e esperar uma ordem totalitária. É um tipo de postura que existiu, por exemplo, dentro da cena black metal durante os anos 90, sem que, contudo, se associassem a algum grupo político.


Editor, dono e podcaster. Escreve por amor à música estranha e contra o conservadorismo no meio underground.