De uns tempos para cá, o termo post-metal ficou muito em voga, sobretudo com grupos como Pelican, Cult of Luna, Altar of Plagues, Ruins, Neurosis, Nadja etc, com uma musicalidade muito diferente e distante das convenções mais tradicionais. Para estas bandas, o termo metal é, talvez, a única coisa que as ligue.
Quando se fala em thrash, death, black e até mesmo o power metal, não é difícil de entender o que caracteriza cada um destes gêneros. Ninguém duvida que este trabalho seja nitidamente power metal, enquanto este, sem dúvidas, é melhor caracterizado como black metal. Contudo, como classificar isto daqui? Ou melhor, quantos gêneros podem ser incluídos nessa música?
Eis o grande problema ao se falar sobre o post-metal: é algo que, a despeito de receber a alcunha de metal, não consegue soar somente como isto. Em diversos grupos podemos ver marcas que vão do metal extremo ao eletrônico. E elas acabam, por consequência, se tornando parte do som e da música, não soando apenas como um enfeite.
Metal: Um gênero em crise
Não é de hoje que as músicas populares como rock, pop e metal sofrem de uma crise criativa. A todo o tempo se produz música apenas com as sobras regurgitadas do passado, com trabalhos soando como aqueles feitos nos anos 80 e 90. Tanto que a onda de revivals tem ganho diversos admiradores, esperando por um produto enlatado e pronto.
Não que isto esteja errado, até mesmo porque as pessoas precisam ir atrás daquilo que as agrada. Reside aí um ar de “conservadorismo”, na qual os valores passam a ser os chamados “tradicionais”, se valendo das alcunhas já estabelecidas, acrescidas, quando muito, de adjetivos como progressive, melodic, atmosferic, symphonic, folk, industrial etc. O Týr, por exemplo, é chamado de Progressive/Folk Metal e oferece marcas tão nítidas dessas misturas, com todos os seus estereótipos, que nada de muito novo é oferecido às pessoas.
Esta é a crise desse sistema, não existe nada de novo ou mesmo de diferente a ser mostrado, apenas replicações e cruzamentos entre tudo aquilo que já está convencionado, no intuito de agradar aos “fãs mais exigentes”. É este pensamento que traz ao mundo um monte de trabalhos repetidos, com aquele gosto de já ter escutado aquilo alguma vez em algum lugar distante da sua memória afetiva.
E isto se converte, sobretudo, no que as gravadoras lançam e disponibilizam aos fãs de metal. Fica muito complicado esperar alguma coisa diferente no meio de tantos grupos cujos membros são bons músicos, a produção dos discos é limpa e muito bem feita e até mesmo as temáticas caem no gosto daqueles que sempre procuram temas como “falar mal do governo”, “falar mal das guerras”, “o ódio contra os cristãos” etc.
Mais uma vez, nenhum problema com quem gosta disto. Mas chega uma determinada hora que não dá mais para gostar disto tudo. Pelo menos não para aqueles que saíram fora do metal e começaram a gostar de outros gêneros (ou, segundo os mais radicais, foram contaminados com estilos ruins).
Uma alternativa?
Post-metal surge dentro de uma cena onde os músicos não são tão ligados ao metal mais tradicional. São pessoas cuja preferência musical está focada em outros horizontes, em sonoridades como shoegaze, progressive rock, avant-garde music, darkwave, post-rock etc., cuja música irá refletir esse aspecto mais amplo e menos engajada com a cena.
Isto significa uma postura diferente por parte das bandas. Elas não estão preocupadas com um público que espera delas sempre um disco tão bom quanto aquele dos anos 80, tampouco estão alinhadas com uma cultura do “avant-garde”. Não existe nem mesmo o desejo de soar como metal, diferente do visto na maioria das bandas mais antigas e mais tracionais. Nem mesmo o conteúdo das letras é essencial, fazendo com que muitos grupos prefiram a vertente instrumental, focando-se unicamente na música e não na mensagem que ela pode transmitir.
Este descompromisso é a raiz de todo o estilo “post-”. Por não se alinhar com a necessidade de “ser uma banda de [insira um gênero aqui]”, os músicos dentro do post-metal podem experimentar muito mais. Não tem como chamar o Neurosis somente de doom metal ou mesmo explicar qual o estilo deste disco do If These Trees Could Talk. Não há necessidade disto, pois a preocupação de quem começa a gostar deste tipo de música é mais com a música em si do que com qual gênero ela tem de ser fiel.
Isto se dá pela farta quantidade de gêneros musicais diferentes e de pessoas que tramitam dentro deles. Hoje é muito mais fácil uma pessoa gostar de Slayer e de Suicide Commando, talvez porque as temáticas musicais se alinham, a despeito da música, embora ambos sejam violentos à sua maneira. Este mesmo fã não se importa se o primeiro é um ícone do thrash metal e o segundo é um ícone do electro-industrial. Para ele, a música precisa apenas agradá-lo de alguma forma. Ter este espectro mais amplo possibilita aos músicos mais novos desenvolver um gosto e uma preferência por mesclar gêneros e até mesmo criar algo em cima disto, pois o seu direcionamento será para a música.
Por conta disto que muita gente de fora do meio metal gosta de post-metal. É uma espécie de metalinguagem, uma forma de falar da música por ela mesma, sendo, ao mesmo tempo, uma forma de transpor a questão do gênero musical em alguma coisa mais “artística”. Isto faz com que alguns sites categorizem as bandas como “art-metal”, uma alusão ao fato de fazerem algo mais preocupado com a arte.
E como será o futuro?
As bandas de post-metal não serão a nova sensação. É muito difícil mudar um paradigma ou mesmo reconstruir alguma coisa em cima de um gênero tão fortemente consolidado como o heavy metal. Da mesma maneira que as pessoas ainda gostam muito de Iron Maiden ou mesmo adoram as bandas que fazem um “tributo” aos anos 80, estas mesmas serão resistentes a qualquer mudança, simplesmente porque o tradicional já é suficiente.
Aqueles que não se contentam apenas com o metal mais tradicional vão encontrar no post-metal uma maneira de apreciar alguma coisa que quebre essas barreiras do convencional. Não irão deixar de gostar dos grupos já consolidados, apenas não mais dedicarão a atenção exclusivamente para isto.
É como arroz e feijão. Tem gente que fica nele e é feliz, pois esta refeição traz a ela conforto, segurança e alimenta bem. Quem consegue fazer um arroz e feijão melhor se destaca porque foge das receitas padrão, mas não deixa de oferecer o tradicional. Mas tem aqueles que de vez em quando querem um Yakissoba, uma comida mexicana ou mesmo um sushi. Isto não fará ele desgostar do arroz e feijão, só estará mais inclinado a experimentar. É assim que você consegue entender como funciona quem curte metal nas vertentes mais conhecidas e confiáveis e quem se arrisca ao novo dentro do post-metal.