Portugal sempre nos impressiona com sua riqueza musical, sobretudo por artistas investindo em gêneros pouco conhecidos. A Necrosymphonic, de Charles Sangnoir (que já foi entrevistado aqui) investe muito em artistas diferentes. E com Aires Ferreira temos uma das melhores surpresas dentro da música.
Ao trabalhar dentro da “Spoken Word”, um gênero pouco difundido em língua portuguesa, o artista declama suas poesias ácidas, cheias de malícias e metáforas muito bem trabalhadas. Este trabalho é único por contar com estilos musicais “de fundo”, oscilando entre o rock, o jazz e o trip-hop, com o cabaré e uma atmosfera mórbida e muito rica musical e liricamente. Uma aspereza entre o choque da realidade banal com a crueldade simbólica das palavras, entremeadas de forma estupenda. Em alguns momentos Aires abandona a recitação e começa a incorporar e dramatizar seus protestos, canta trechos que seriam somente falados, é quase como estar diante de uma peça trágica de um teatro musical. Escapa do óbvio, do tradicional, somente para colocar-nos contra as nossas realidades.
Destacam-se “Vossa Senhora de Fátima“, com a participação de Sangnoir, com seu ritmo de cabaré; “Idade de Ferro” e seu jeito de um jazz-rock decadente e sujo e umas guitarras mais pesadas; “Fuma que isso passa” traz uma riqueza musical combinando com a melodia natural da voz de Aires e “Drogaria” e seu trip-hop recitado.
É um disco esplêndido, necessário de ser ouvido diversas vezes, representando um lado pouco conhecido e merecedor de todas as honras. Seja pelo conteúdo musical, lírico ou mesmo pelas suas poesias carregadas de um ressentimento tragicômico com a realidade e seu protesto contra o sistema.
Tracklist:
1. Desdenho Inteligente
2. Vossa Senhora de Fátima (com Charles Sangnoir do La Chanson Noire)
3. A Idade do Ferro
4. Não Digo Nada de Jeito?
5. Rai’s Parta a Vida
6. Vai-se Andando
7. Fuma Que Isso Passa
8. Drogaria
9. Asco (com Pestilens / Penitência)
10. Que se Foda
11. Revelação (Com Vilkacis da banda Ars Diavoli)