Welkins Boreal: “Não acho que as coisas irão mudar para sempre”

8 min


0

You can read this post in: English

Welkins Boreal foi fundada pelo compositor Teemu Kautonen em 2018 em Helsinque, Finlândia, tocando algo que pode ser classificado como um gothic metal com doses generosas de gothic rock. Entrevistamos Teemu, que já passou por muitas bandas, incluindo Darkwoods My Betrothed, Furthest Shore, Nattvindens Gråt e Wizzard.

Olá a todos, como estão? Começando nossa entrevista, poderia nos contar um pouco sobre a história da banda e como foi o seu começo na música?

Era um domingo ensolarado em Helsinque e estava no meu escritório que tenho aqui em casa com uma xícara de café bem forte (NOTA DE TRADUÇÃO: em outros países eles chamam qualquer café bem forte de “café brasileiro” ou “Brazilian coffee”), então as coisas poderiam ficar piores, obrigado. Tenho tocado em bandas desde meus onze anos e sou bem ativo na cena underground da metade dos anos 1990 em grupos como Darkwoods My Betrothed (DMB), Nattvindens Gråt, Wizzard e Furthest Shore. Contudo, nas primeiras duas décadas deste novo milênio eu foquei na minha carreira profissional e comecei uma família, que tomou todo o meu tempo e energia, não restando nada para a música. Finalmente, no final de 2018, percebi que era hora de recomeçar, agora que o trabalho e a família me deixaram tempo para outras coisas. Na verdade considerei voltar com o Nattvindens Gråt, mas depois de pensar e conversar com meus amigos, decidi fazer algo novo, com uma banda com nome em inglês. Então assim nasceu Welkins Boreal em dezembro daquele mesmo ano.

Escutei ‘Phantoms of Yesteryear’ e ele me lembrou bandas como Poisonblack, To/Die/For and Charon. Quais artistas te influenciaram?

Para ser honesto, tenho dificuldades em encontrar bandas para comparar com a minha música quando tenho de escrever para assessorias de imprensa sobre o primeiro álbum. Perguntei para muitos amigos e jornalistas ligados à música e todos eles me aparecem com um conjunto diferente de bandas. O denominador mais frequente foi o Sentenced, o que é engraçado, já que nunca ouvi nada deles. As canções desse primeiro disco são originalmente do Nattvindens Gråt que há anos queria regravar de maneira adequada, pois os arranjos originais e a gravação não faziam justiça às ideias de composição. Elas foram escritas entre 1995-1996 e outras entre 1999-2000, então cronologicamente elas não poderiam ser influenciadas pelas bandas que você citou – eu penso que deve ser apenas coincidência. Acho que esses caras e eu, por termos a mesma idade, fomos influenciados pelas mesmas bandas, o que faz com que sejamos parecidos. Minhas grandes influências devem ser o heavy metal dos anos 1980, como Iron Maiden e King Diamond, mas minhas bandas favoritas de todos os tempos são Bathory e Candlemass. No topo disto tem algumas bandas com influências de pop, de Paradise Lost (eu gosto mais dos seus discos menos pesados) e Katatonia. Acredito que isso descreve a estranha mistura que é o Welkins Boreal!

Teemu, você veio de uma banda de black metal (Darkwoods my Bethoted é uma das minhas favoritas) e Welkins Boreal é mais gótica. Como você mudou sua musicalidade?

Fico feliz que você goste do DMB! Os primeiros dois discos têm um lugar de respeito como clássicos de sua era. O terceiro eu não curto muito porque é mais tradicional, pois eu sempre gostei do material mais voltado ao Epic Viking, o que não surpreende, já que os discos épicos do Bathory são os meus favoritos. Fizemos uma escolha consciente em 1997 para irmos do material épico para o Furthest Shore e, para mim, baixar o tom das canções do DMB. O som gótico da Welkins vem do Nattvindens Gråt, que eu mantinha paralelo ao DMB por muitos tempo nos anos 1990. E vejo como uma continuação do Nattvindens Gråt, mas queria me livrar do nome em sueco que era mais uma tendência que uma vantagem.

Na Finlândia, acho (e por favor, diga-me se estou escrevendo alguma bobagem) que há um monte de bandas de metal, mas vejo mais grupos de power / symphonic metal vindo daí. Poderia nos explicar como é a cena metal no seu país?

Para ser honesto, não sigo muito a cena metal, então não sou a melhor pessoa para comentar. Não conheço muitas bandas ativas hoje, provavelmente porque estive afastado da cena por muito tempo. Tudo que posso dizer que é a cena parece mais vibrante e há muitas bandas e shows – bem, pelo menos em tempos normais…

Como você classifica o seu estilo musical hoje? Para mim soa como uma versão gothic rock de bandas dos anos 1980 como Fields of Nephelim e Sisters of Mercy.

Uma versão metal de gothic rock descreve bem ‘Phantoms of Yesteryear’. O novo EP ‘Ashes’ tem músicas mais épicas e pesadas – talvez sobras do Wizzard e do Furthest Shore. Uma ideia fundamental sobre como começamos era de não forçar um gênero ou tipo de música específico, mas criar uma tela em branco que podíamos pintar do jeito que quiséssemos. Então o material novo é mais variado, então acho que isto fica mais atraente para os ouvintes. Sei que é uma ideia bem estúpida em termos de marketing fazer algo assim, sobretudo quando é muito difícil diferenciar e apontar para algo mais restrito, que seria a melhor maneira de se fazer. Mas somos da velha guarda e fazemos música primeiro, imagem em segundo lugar e sentindo-nos livres para trabalhar na música que gostamos é o principal.

Fui surpreendido quando li que você regravou algumas músicas do Nattvindens Gråt (banda que eu gosto muito). Como foram essas canções? Elas soam mais sombrias ou pesadas?

O primeiro disco é um produto de seu tempo e é belo em sua inocência, pois eu tinha 18-19 anos quando fiz esse material. Porém, achei que material das músicas do segundo disco, “Chaos Without Theory” era muito bom, mas a execução, lá em 1996, era pobre quando gravamos no famoso Tico-Tico Studio. O material era mais desafiador que meus outros trabalhos e minhas habilidades musicais não eram suficientes para fazer grandes arranjos que fizessem jus às composições. E também tivemos apenas cinco dias para gravar tudo, o que significa que corremos entre as gravações como loucos, fazendo tudo em cima da hora etc, especialmente os vocais, que ficaram horríveis, com algumas exceções. As músicas estavam com a nota errada para o vocalista (eu sabia qual era o tom certo, mas preferi tocar o que era mais fácil de fazer na guitarra) e esse vocalista tinha pouco tempo para gravar, então a receita para o desastre estava pronta. O produto final ficou tão merda que nem conseguia ouvi-lo. Este é o motivo de eu querer este tempo todo refazer as melhores canções com uma produção que fosse adequada às suas ideias. Em ‘Phantoms of Yesteryear’, creio que as músicas são apresentadas como deviam ter sido feitas e como sempre quis que elas fossem. Não acho que elas sejam mais sombrias ou pesadas que as originais: elas estão a anos-luz melhores.

Uma pergunta bem desconfortável: como a COVID-19 te afeta? Você acha que o mundo irá mudar após a pandemia?

Não acho, para falar a verdade. A Finlândia teve uma das menores taxas de infecção da Europa e depois de meses, após as escolas e restaurantes ficarem fechados, as coisas estão perto do normal. E bem, tenho que trabalhar de casa por cinco meses e os shows foram todos cancelados, o que é bem ruim, especialmente quando eu tinha alguns ingressos para ver bandas bem legais, como Iron Maiden, Helloween, Candlemass e WASP. Pelo menos eu consegui ver um show do Geoff Tate e sua banda tocando “Rage for Order” e “Empire”, que foi algo bom para mim, pois o Geoff é um dos meus vocalistas favoritos.

Não acho que as coisas irão mudar para sempre. Terá um período de transição de, talvez, dois a três anos, com recuperação da economia e a espera pela vacina que virá ao mercado e começará a se espalhar. Mas uma vez que aconteça, pessoas irão esquecer tudo sobre isto – e isso irá acontecer bem rápido, ao meu ver. E as coisas voltarão a ser como antes. Pessoas aprenderão a rotina de lavar suas mãos com mais frequência.

Continuando a pergunta anterior, e as lives? Qual sua opinião sobre músicos que se apresentam em lives no Instragram, Facebook, YouTube? Aqui é um pouco comum para aristas mais famosos.

Músicos tem que fazer o que podem com a situação. Não tenho visto nenhum show em live, assim como não vejo muito sentido nelas do ponto de vista do fã, a menos que você queira muito ajudar sua banda favorita, mas você pode ajudar de outras maneiras, como o Patreon ou, claro, comprando coisas, como eu tenho feito. Do ponto de vista dos músicos, entendo completamente que seja um caminho para fazer o melhor numa situação ruim. Músicos profissionais são extremamente dependentes dos lucros dos shows e do merchandising vendido em tempos que os álbuns não dão nenhum lucro relevante. Como um fã de música, considero que terei de esperar mais até passar essa loucura do corona e então ter alguma esperança de ver minhas bandas favoritas ao vivo de novo!

Somos um site brasileiro de música e, claro, sempre perguntamos sobre bandas daqui do país. Você conhece alguma? Quais você curte?

É bem embaraçoso dizer isso, mas acho que só conheço Sepultura e Sarcófago. Nunca fui muito fã da última banda, mas lembro de ter tocado muito “The Laws of Scourge” quando era adolescente. Sei que a cena aí é muito ativa, com muitos fãs e bandas. O problema, acho, é que eu não sigo muito a cena atual. Isto é parcialmente a maldição dos serviços de streaming: há uma abundância de novas músicas o tempo todo, ao mesmo tempo em que é muito tedioso navegar por elas. Como resultado, você desiste e fica com os clássicos dos anos 1980, e isso é uma pena, pois eu deveria me esforçar para conhecer coisas novas também. Deve ter toneladas de bandas excelentes por aí – mas como encontrá-las hoje em dia?

Você vive da sua música ou tem outro emprego? Aqui no Brasil é bem difícil ser um músico em tempo integral, pois equipamentos são caros e o dólar não tem ajudado. As pessoas também não apóiam bandas novas e preferem pagar por um show caro a ajudar um artista local.

Acho que este é um fenômeno global. Alguns dizem que o streaming democratizou a música, fazendo com que todos possam disponibilizar suas músicas ao redor do mundo a um custo baixo. Mas isto é um exagero de um fenômeno chamado economia dos astros, onde alguns poucos artistas muito grandes – que antes tinham uma base de fãs grande no começo da era do streaming ou tem uma boa verba para publicidade – conseguem 99% de toda a atenção e dos ganhos, deixando dezenas de milhares de bandas com migalhas. Bandas pequenas e médias não conseguem ganhar dinheiro apenas com a música. Mas nos anos de 1990, podíamos fazer um acordo com uma gravadora pequena que conseguisse vender CDs o bastante, fazendo com que os gastos com estúdio fossem cobertos. Hoje tenho de aceitar que fazer música apenas gera gastos e que não dá lucro mais. Então, sim, eu tenho um emprego regular de dia que paga minhas contas e também cobre os custos que tenho com a música. Para ser um músico em tempo integral você precisa estar em uma banda relativamente grande e ter muitos shows ao vivo.

Algumas vezes pondero sobre o que irá acontecer em dez anos quando muitas das bandas grandes tiverem se aposentado. Quantas bandas grandes há hoje tocando metal e hard rock que não fosse grande na década de 1980? Claro, apenas o Rammstein e o Nightwish me vem à cabeça, mas claro que tem outras. Mas o meu ponto é que muitas desas bandas grandes que ficam com quase todo o lucro e atenção não irão mais existir em dez anos. Novas bandas grandes irão surgir? Metal estaria voltando ao underground de novo? Haverá fás jovens o suficiente que procurem o metal de novo? Minha impressão hoje é que a maior parte dos fãs do gênero são caras entre 40 e 50 anos que cresceram na cena no final de 1980 e começo de 1990.

Tem alguma recomendação de bandas locais? Recentemente descobri algumas bandas finlandesas de post-punk e acho que a gente aqui não sabe como é rica a cena aí.

Há um monte de bandas na Finlândia hoje, mas uma que eu realmente gosto é a Sleep of Monsters, que é a banda nova do meu velho amigo Ike Vil, ex-Babylon Whores. Eles tocam dark rock / metal, num gênero que eles apelidaram de AOR (Adult Occult Rock). Eu gosto muito da música deles. E também não sei que bandas comparar com eles.

A gente aqui agradece o seu tempo e gostaríamos muito que deixasse algumas palavras para os nossos leitores. Manda bala!

Muito obrigado pela oportunidade de falar com fãs brasileiros de metal. Agitem muito e escutem Welkins Boreal se você gosta de uma banda cativante e direta!


Editor, dono e podcaster. Escreve por amor à música estranha e contra o conservadorismo no meio underground.